segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Como trabalhar a escrita?

Os corajosos que se arriscam a entrar na empreitada da escrita são, frequentemente, assaltados por um conjunto de dúvidas variadas que vão desde a ideia do enredo em si ao questionamento das suas próprias capacidades. Talvez isto aconteça porque fomos educados a olhar para a literatura, como para outras áreas artísticas, com olhos de deusificação. Muitas vezes, a tendência é para ver o escritor como alguém que nasceu com um talento raro e absoluto e que, por isso, consegue enlear-se nas palavras sem esforço. Se é certo que os génios existem, não é menos verdade também que a genialidade necessita de ser desmistificada. Quero com isto dizer que a criatividade e a formação também têm um lugar importante na criação literária. Escrever é uma arte que se aperfeiçoa, como todas as outras. Claro está que, muitos de nós, têm uma sensibilidade mais acurada para determinadas matérias ou atividades, mas a escrita é tão vergável aos efeitos da prática como qualquer outra área.

As técnicas aprendem-se. A imaginação estimula-se. A prática e a persistência devem ser constantes. E a qualidade da nossa escrita é absolutamente essencial nesta empreitada. Quanto mais lemos, mais rico se torna o nosso vocabulário e maior é a nossa perspicácia para percebermos como se constrói um bom texto. Por sua vez, quanto melhor for a qualidade da nossa escrita, maiores são as hipóteses do nosso trabalho se distinguir dos restantes e, por isso mesmo, vir a ser publicado. Claro que, na ficção em particular, a coerência do enredo, a intensidade das personagens ou a atualidade do tema são elementos cruciais para a publicação da obra, mas a riqueza da escrita tem de ser um elemento transversal a todos estes. Sabiam, por exemplo, que muitos editores e agentes ignoram por vezes as sinopses dos livros que recebem passando diretamente ao original? Se a escrita for boa, voltam à sinopse mas, se não o for, então o original só pode ser posto de lado. Entendem agora a importância do trabalho de escrita?

É certo que não há regras que garantam uma escrita de qualidade, mas existem várias técnicas para ajudar a evitar uma má escrita. É a escrita de qualidade que, por exemplo, consegue estabelecer a diferença entre os clichés vulgares e as repetições intencionais de efeito poético; é ela que permite evitar pleonasmos, inventar novas palavras, disseminar figuras de estilo ou contribuir para o enriquecimento da nossa língua. Foi com este objetivo em mente que decidi entrar nesta empreitada com o Quinto Editor para partilhar convosco algumas técnicas que tenho vindo a absorver nas minhas aulas de Escrita de Ficção e de Revisão de Textos. Fiquem atentos pois, durante as próximas semanas, vamos desenvolver tópicos tão diversos como grandes inícios da literatura, palavras intraduzíveis, figuras de estilo, exercícios para evitar os erros mais comuns ou técnicas para construir cenários convincentes, diálogos dinâmicos e personagens inesquecíveis, entre muitos outros. 

Eça de Queiroz demorou 10 anos a escrever Os Maias, James Joyce levou 7 para compor o grande Ulisses e Gustave Flaubert tinha por hábito dizer que «o talento é paciência sem fim». A isto eu acrescento que ele é também a força da prática, da repetição, da persistência, do método e, claro, da ambição. 

Escrito por Bárbara Soares

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